Por Daniel Petrillo
Demora na expedição de licenças ambientais vira objeto de estudo da FGV; rotatividade de funcionário é um dos problemas
Grandes obras, em geral, acabam empacando na hora de tirar a licença ambiental – instrumento criado para proteger o meio ambiente de atividades poluidoras, mas considerada pelos empreendedores um dos principais motivos para os atrasos nos cronogramas. Usina de Belo Monte, no Pará, Rodoanel Mário Covas, em São Paulo, e a transposição do Rio São Francisco, no Nordeste, são algumas que tiveram problemas nas aprovações.
As reclamações são tantas que a Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas (FGV) fez uma pesquisa com 200 representantes de setores representados pelas empresas, governo e organizações da sociedade civil. O objetivo era identificar os desafios do licenciamento ambiental no Brasil. “A demora na obtenção da autorização acontece principalmente pela falta de capacitação na gestão e fiscalização dos órgãos ambientais”, diz Flávia Scabin, uma das coordenadoras do estudo apresentado na semana passada.
“Há uma grande rotatividade nos órgãos ambientais, o que leva a um quadro de profissionais pouco experientes”, diz Luiz Gabriel Azevedo, diretor de sustentabilidade da Odebrecht Infraestrutura.” Um incentivo para o profissional se especializar seria desejável.”
Cautela. “Todos esperam processo mais rápido, mas há risco de algumas questões passarem desapercebidas e causarem dano ambiental irreversível”, diz Patrícia Iglecias, professora da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP). Para evitar isso, uma resolução do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) dividiu o processo em três etapas: licença prévia, de instalação e de operação.
Na obra do Rodoanel Mário Covas, a primeira etapa durou quatro anos, quatro vezes mais do que planejado. O prazo de análise varia de acordo com as particularidades do empreendimento. Por lei, o processo deve ser analisado em até seis meses. Se houver necessidade de Estudo de Impacto Ambiental na obtenção da Licença Prévia, o prazo se estende para um ano.
“Ocorrem alguns entraves porque questões não foram atendidas. Em grandes obras é praxe os prazos serem longos, dadas as dificuldades dos estudos”, diz Patrícia.
O Estudo de Impacto Ambiental (EIA) deve conter identificação e avaliação dos impactos ambientais e definição das medidas mitigadoras. No Rodoanel foram propostos 26 programas como medida mitigadora. Um deles é o “Programa de Criação e Apoio a Unidades de Conservação”.
Para a chefe da consultoria jurídica da Secretaria do Meio Ambiente do Estado de São Paulo, Silvia Helena Nogueira Nascimento, o problema não está na lei, mas nos desvirtuamentos por falta de políticas públicas. “Muitas exigências não são de cunho ambiental, mas social. Aproveitam que um empreendimento vai ser implantado e exigem, como medida mitigadora, a resolução de um problema social preexistente.” Não há limites claros na legislação atual para a imposição das condicionantes em obras de grande porte. Há até pedidos de rodovias e hospitais.
Na construção da hidrelétrica de Santo Antonio, no Rio Madeira, em Rondônia, constatou-se um grande nível de desemprego na região. “Nós criamos um programa e capacitamos 48 mil pessoas para trabalhar na obra. A iniciativa evitou a migração de 22 mil trabalhadores”, diz Luiz Gabriel Azevedo, da Odebrecht. A usina que entrou em operação em 2012 custou R$ 20 bilhões. Desse total, R$ 2 bilhões foram para o programa de sustentabilidade.
Advogado do Instituto Socioambiental (ISA), Maurício Guetta chama a atenção também para a enxurrada de processos que surgem sempre que uma nova obra começa a ser planejada. “Belo Monte tem pelo menos 20 ações públicas da sociedade civil correndo”, diz Guetta. Mesmo quando não há condições para a liberação da licença ambiental, a Justiça pode recorrer a um instrumento chamado de suspensão de segurança, prerrogativa processual colocada à disposição do poder público tendo como razão legitimadora a salvaguarda do interesse da sociedade. Guetta lembra que foi desse modo que saiu a aprovação para a retirada da vegetação onde foi levantada a usina de Barra Grande (RS).
Fonte: O Estado de S. Paulo