No comando de uma entidade que congrega “todas as construtoras que não estão na Lava Jato”, o presidente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), José Carlos Martins, esteve na semana passada, em encontros separados, com os ministros do Planejamento, Nelson Barbosa, e da Fazenda, Joaquim Levy. O recado não poderia ser mais claro: “O nosso setor está na UTI”, disse aos dois.
Acumulando faturas a receber do governo por obras em rodovias a cargo do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) e do programa Minha Casa Minha Vida (MCMV), as construtoras de médio porte dizem estar sem caixa. E aguardam uma resposta do governo até terça-feira. Do contrário, ameaçam paralisar obras, cobrar as dívidas na Justiça e fazer um barulho que empalidecerá as manifestações dos movimentos sociais. A seguir, os principais trechos da entrevista concedida ao Estado.
O Sr. esteve com os ministros do Planejamento e da Fazenda. O que disse a eles?
Que o nosso setor está na UTI. E que não dá para desligar os aparelhos.
Que aparelhos?
Os pagamentos do governo para o nosso setor. Eles têm de ter um mínimo de forma, não podem ficar como estão. Quando as empresas foram convidadas a fazer o programa Minha Casa Minha Vida, a regra era recebimento “vapt vupt”. Então, todo mundo contratou sem ter a necessidade de capital de giro. O dinheiro demorava quatro, cinco dias. Hoje, não. Está pago até 6 ou 7 de maio. Esse atraso, que parece pequeno, é fatal para quem se programou para receber de imediato.
E o Minha Casa Minha Vida 3?
Poderia dar um alento, principalmente nas faixas 2 e 3. Mas ainda não saiu. E nem se conta com a construção comercial e industrial. Quem está pensando em fazer indústria hoje?
Como está o emprego no setor?
Hoje, temos 2,8 milhões de pessoas, mas está caindo. De outubro para cá, já perdemos 310 mil. E, até o fim do ano, vão mais 500 mil. Entendemos que tem de fazer o ajuste fiscal, mas isso não se faz só cortando despesas. Tem de arrecadar. O problema do Minha Casa Minha Vida se resolve com R$ 1,5 bilhão. Será que é tão difícil colocar esse assunto em dia e preservar 400 mil empregos, que recolhem tributos e não pressionam o seguro-desemprego?
E qual foi a proposta que os senhores apresentaram?
Nossa proposta é que se acerte o passado e se estique o cronograma de execução das obras. Esperamos uma resposta até terça-feira. Eles precisam fazer uma conta com a previsão do que se vai consumir até o fim do ano e compatibilizar com o que tem de recursos.
E se não tiver resposta?
Nosso pessoal está desesperado. Não tem outro termo. E estão com ideias malucas de fazer várias coisas País afora: paralisar obras, coisas drásticas. O espírito está belicoso. Na reunião do Planejamento, eu disse: ‘Se vocês acham que os movimentos sociais fazem estardalhaço, não sabem o que esse povo vai fazer, no desespero que está’. Há risco de judicialização desse processo. Eu avisei: ‘O que vai ter de empreendimento paralisado, gente invadindo, vocês tendo de retomar e consertar o que foi estragado e empresa entrando na Justiça, não têm noção’. Esses dias, teve uma obra grande do Minha Casa Minha Vida no Pará em que os caras não receberam. Eles fecharam a estrada, fizeram o maior estardalhaço. Estamos tentando segurar esse ímpeto e chegar a bom termo.
O Sr. acha que as construtoras médias poderão participar da nova etapa de concessões?
É balela essa história que, sem as grandes, não tem quem faça. Tem, sim, desde que o modelo esteja adequado. Mas as empresas estão com sérios riscos.
Fonte: O Estado de São Paulo