Por Toni Sciarretta e Pedro Soares
Com juros entre os mais altos do mundo, o Brasil tem dificuldade para viabilizar investimentos de longo prazo de maturação e de baixo retorno, como habitação, saneamento e infraestrutura.
Os poucos projetos que saem do papel recorrem aos juros subsidiados do BNDES e ao dinheiro carimbado da poupança.
Em outubro de 2012, quando o Banco Central reduziu a taxa básica de juros, Selic, para 7,25% (ou 2%, se descontada a inflação), os bancos e os investidores começaram a cogitar financiar esses projetos como ocorre no restante do mundo. Para dar impulso, o governo concedeu isenção de IR (Imposto de Renda) para quem investisse nos projetos, como já ocorre com os papéis e fundos imobiliários.
A aventura brasileira pelos juros baixos, no entanto, durou pouco, e o BC voltou a subir as taxas em abril de 2013 para combater a inflação, adiando seus planos de investimento em infraestrutura.
Para viabilizar a construção, por exemplo, de uma ferrovia que só entrará em operação em dez anos, há uma engenharia financeira que busca emprestar os recursos hoje tendo como garantia a receita da própria ferrovia, que só virá no futuro.
A conta não fecha quando a taxa de retorno do investimento em infraestrutura é muito inferior aos juros do mercado -no caso, a Selic, considerada livre de risco.
Só que os riscos de uma obra como uma ferrovia ou uma usina hidrelétrica são relevantes. Há risco de engenharia, trabalhista, de a licença ambiental não sair (ou atrasar) e até de os juros subirem no país.
BNDES
É aí que entra o BNDES com as taxas subsidiadas.
O problema é que o banco de fomento não tem mais recursos para bancar sozinho obras de infraestrutura estimadas pelo Ministério da Fazenda em mais de R$ 1,5 trilhão até 2025. E o SFH (Sistema Financeiro da Habitação) também não disporá de recursos das poupanças para financiar sozinho R$ 800 milhões na construção de 6,6 milhões de casas, o deficit habitacional brasileiro.
Nos governos Dilma e Lula, o BNDES cresceu e espalhou sua atuação para áreas que estão longe daquelas que antes eram prioritárias. Os críticos da mudança fazem restrição a ações como financiar empresas com a finalidade de estimular o consumo.
Esses mesmos críticos afirmam que o orçamento atual do banco e seus juros abaixo dos praticados pelo mercado distorcem a economia, ao impedir o avanço do crédito privado para financiamento de longo prazo.
Outro ponto de contestação é o uso do dinheiro do Tesouro -que registrou em setembro seu primeiro deficit em duas décadas- para emprestar a empresas que podem ser atendidas pelo mercado externo de captações ou mesmo por bancos brasileiros. É o caso de gigantes como Vale, Petrobras, Ambev, JBS, entre outros.
Em 2008 e 2009, a crise justificava essa atuação, inclusive como provedor de capital de giro, porque era uma emergência, avaliam.
Para esses analistas, o retorno social do financiamento é baixo. Melhor seria direcionar recursos para crédito à exportação e à infraestrutura, argumentam.
O BNDES diz que seu foco é o investimento, sobretudo para máquinas e equipamentos -o que eleva a capacidade produtiva da economia.
LIMITES
Desde 2011, porém, a estratégia parece ter efeito limitado. A taxa de investimento não decola. Passou de 18,9% no segundo trimestre de 2011 para 16,5% no mesmo período deste ano. Calcula-se que seria necessária uma taxa de 22% a 23% para possibilitar uma expansão do PIB de 4%.
Luiz de Magalhães Ozório, economista do Ibmec, diz que a atuação do banco é necessária e seus processos de concessão de crédito são rigorosos. “O BNDES atua quando há uma falha no mercado de capitais, emprestando para projetos que são relevantes.”
Para o economista, o banco poderia focar infraestrutura e ampliar o acesso de médias e pequenas empresas. “Muitas não se enquadram nas regras e pegam dinheiro, a custo maior, nos bancos.”
Fonte: Folha de S. Paulo