Questionamentos levantados na entrevista foi o não pagamento de Imposto de Renda pela FIFA
A assessoria de comunicação do CAU/DF entrevistou Aldo Paviani, professor emérito da UnB e geógrafo da Companhia de Planejamento do Distrito Federal (Codeplan/DF). O diálogo surgiu a partir da necessidade de explicar à população sobre os megaeventos e os impactos desses junto às cidades e pessoas. A Copa do Mundo mostrou o Brasil, seu povo, cultura, mazelas e a criatividade do jeito brasileiro em meio aos problemas de mobilidade urbana.
A mobilidade transversal foi uma solução encontrada pelo governo para fluir o trânsito e ajudar no deslocamento de torcedores brasileiros e estrangeiros. A medida foi eficiente, porém temporária. O professor Aldo Paviani, explica que esse plano deve ser pleiteado pela população, pois é uma forma mais eficiente de evitar o uso do carro. Para o professor, esse modelo deve ser incluso nos planos diretores para minimizar os problemas diários de mobilidade urbana.
Um dos questionamentos levantados na entrevista foi o não pagamento de Imposto de Renda pela FIFA. A organização encaminhou uma carta resposta onde informa que as subsidiárias da FIFA como o Centro de Ingressos, o Comitê Organizador Local e os prestadores de serviços são tributados nos termos da legislação nacional, e ainda foi recolhido imposto sobre cada ingresso vendido. Para ter acesso à carta, basta clicar no link no final da matéria.
CAU/DF – Quais os impactos negativos e positivos desses megaeventos, Copa do Mundo e Olimpíadas?
R – IMPACTOS NEGATIVOS:
A construção de estádios caríssimos, deslocando verbas necessárias para a Educação, para a Saúde Pública e para o transporte dos trabalhadores. Em junho de 2013, as manifestações de rua deram uma evidência de que o brasileiro esteve insatisfeito com as péssimas condições do transporte público em nossas metrópoles, justamente por falta de investimentos compatíveis com as demandas da população – pois os recursos foram direcionados à construção de grandes estádios (que, provavelmente ficarão ociosos, após a Copa do Mundo).
A Fifa arrecadou milhões e algumas mídias estão informando que a mesma não pagou Imposto de Renda. O brasileiro pagador de impostos merece que se esclareça essa “isenção”; a Fifa obrigou a venda de bebidas alcóolicas nas arenas, contrariando e modificando as leis brasileiras que proíbem o consumo de bebidas alcóolicas nos estádios; a Fifa obrigou que os torcedores estacionassem distante dos estádios e tantas bobagens que gerou aborrecimentos nos brasileiros e estrangeiros que vieram assistir aos jogos da Copa.
Outro problema negativo foi o deslocamento de moradores de favelas ou conjuntos habitacionais visando a construção de alojamentos para os atletas da olimpíada – como no Rio de Janeiro. Isso feriu o direito à moradia e acarretou protestos nas áreas atingidas pela truculência dessa medida.
A maior dado negativo foi nossa seleção ter perdido de 7 X 1 para os jogadores alemães, e de 3 X 0 para Holanda, retirando-se da competição em quarto lugar de forma melancólica. Isso deverá influir nos rumos do futebol brasileiro. Ou o esporte, em geral, se recicla (mudando a mentalidade dos dirigentes), diante do insucesso ou continuaremos numa trajetória que irá desestimular o brasileiro a ir a jogos “normais”, durante o ano. Como prestigiar um esporte que interessa a 200 milhões de brasileiros.
Ademais, ficou o exemplo da Alemanha, que desenvolveu programação durante mais de uma década, sobretudo em termos educacionais, de fisioterapia e de preparo psicológico dos atletas.
2 – IMPACTOS POSITIVOS (sem ordem de importância):
Aprendizagem quanto à formação de equipe esportivas (treinadores, jogadores de todas as modalidades, etc.) para realmente competir em uma Copa internacional. Tomada de medidas para fazer uma faxina na CBF – onde há dirigentes sendo reeleitos de forma suspeita e sem transparência na aplicação dos milhões arrecadados, algo a ser repensada.
Entendimento ocorrido das forças civis e militares quanto ao esforço para manter a segurança nos estádios e fora deles, ato que inibiu a ação de delinquentes nas cidades sedes dos jogos da Copa/2014.
Organização de transporte coletivo nos dias de jogos, embora com grande sacrifício dos que não se submeteram ao calendário imposto pela Fifa, pois estavam em dias normais de trabalho.
Comportamento exemplar do povo brasileiro, que foi receptivo aos estrangeiros, há depoimentos na imprensa informando a satisfação de torcedores de outros países em conhecer o Brasil. Muitos demonstraram interesse em voltar ao país. Essa manifestação resulta em outro dado positivo que é o grande estímulo ao turismo.
O turismo não teria acontecido se não fosse a realização da Copa. Isso sinaliza para que se tome medidas para que o outro megaevento, as Olimpíadas, seja um sucesso, independente de ganhamos mais ou menos medalhas (quanto mais melhor, mas acredito que nossos atletas não tenham recebido o apoio para bem se preparar para esse outro grande acontecimento). Com a falta de patrocinadores, muitos competidores brasileiros não estarão preparados para se colocar bem nos diferentes pódios desse importante evento.
Espera-se que em todas as esferas governamentais – municipais, estaduais e federal, se tomem medidas para valorizar os professores, estimular o desenvolvimento educacional em todos os níveis. A Educação integral e plena é a única maneira de se ter um país que valorize as crianças e jovens para o desenvolvimento nacional e regional, inclusive nos esportes.
CAU/DF – As manifestações ocorridas no ano passado, apelaram por condições básicas para o cidadão, mas este ano e durante a Copa não ocorreram protestos, há alguma explicação sobre esse comportamento do brasileiro?
R – A psique coletiva, dos que atenderam aos jogos, explica que o brasileiro tem forte ligação com o futebol, deixando de lado os protestos. Provavelmente, os governantes haverão de suprir as lacunas educacionais e de infraestrutura a ser implantadas de forma compatível com a massa populacional, especialmente nas grandes cidades brasileiras. Pesquisas da Codeplan no DF e na Área Metropolitana de Brasília demonstram que, com maior ou menor intensidade o brasileiro torce para uma determinada equipe. Ademais, as depredações dos “black-blocs” desanimaram os que protestavam pacificamente e, posteriormente, repudiaram os que aproveitaram para fazer o que se denominou “baderna”.
CAU/DF – Os turistas elogiaram as cidades, porém questionaram os preços,
porque o Megaevento elevou tanto os custos dos produtos, dos hotéis, passagens aéreas e alimentação?
R – Simples: o capitalismo é aproveitador de oportunidades e a Copa do Mundo, fez com que muitos aumentassem os lucros aproveitando a Lei de Gerson (“levar vantagem em tudo”) ou mesmo a Lei da Oferta e da Procura. Ao acabar a Copa, os preços haverão de voltar ao patamar aceitável.
CAU/DF – Durante a nossa conversa, o senhor aprovou a medida adotada pelo governo sobre a mobilidade transversal, será que essa solução pode ser implantada para ajudar a população?
R – Penso que isso deva ser fortemente divulgado para ser inserido na Lei de Uso e Ocupação do Solo (LUOS), no Plano Diretor de Ordenamento Territorial (PDOT) e no Plano de Preservação do Conjunto Urbanístico de Brasília(PPCUB). Pois é passado o momento de diversificar as rotas existentes, inclusive para se possa sair das quadras 600 para as 900 sem o uso de automóvel. Isso pode ser implantado com micro-ônibus da CTB, com bilhete subsidiado, pois essas rotas não interessam às atuais empresas de transportes, que buscam a grande demanda para elevar seus lucros…
Ademais, a mobilidade urbana no DF e na Área Metropolitana de Brasília é um nó a ser desatado para que a cidade não entre em colapso nos próximos 12 anos. O grande desafios e termos fluidez no trânsito e na mobilidade em geral, inclusive com a descentralização das atividades econômicos para os anéis externos do Plano Piloto e/ou para os 12 municípios da Área Metropolitana, verdadeiras cidades-dormitórios a espera de investimentos que possibilitem reter trabalhadores nas cidades em que residem. Esse desafio está na pauta de quantos queiram colaborar com o desenvolvimento urbano e regional no Centro-Oeste brasileiro.
CAU/DF – Nos dias de jogos em Brasília, tivemos uma descentralização do centro da cidade, essa medida pode ser melhor implementada para reduzir carros na área central e diminuir o trânsito?
R – Isso foi uma imposição da Fifa, que gerou insatisfação dos torcedores em seus deslocamentos até os estádios. Após a Copa tudo volta ao padrão anterior. A descentralização que um geógrafo deseja é a dos postos de trabalho do Plano Piloto para as outras 30 Regiões Administrativas. Ou que cada núcleo urbano receba novas empresas para que a população não necessite se deslocar do local de moradia para trabalhar no Plano Piloto. O ideal e equalizar o local de residência como sendo também o local de trabalho.
CAU/DF- Outro megaevento estará de volta em dois anos, as Olimpíadas, logo iniciarão as construções faraônicas e mais gastos para os bolsos dos brasileiros, o que poderá gerar manifestação ou o povo será condescendente?
Acrescento que os protestos já iniciaram e terão grande importância por ocasião das eleições. Os truculentos que impõem medidas como essas não serão eleitos e muitos igualmente não serão reeleitos, o que provocará uma grande renovação dos legislativos do Brasil inteiro, uma vez que os legislativos são abrigos de escândalos e falcatruas e verdadeiros sumidouros de verbas públicas, tal como a imprensa vem denunciando há mais de uma década.
CAU/DF – Qual o resumo que se pode fazer sobre a Copa do Mundo em Brasília?
R – Espero que a criatividade do brasileiro chegue aos governantes para que o Brasil tire o maior proveito possível desses e de outros megaeventos, administrando melhor os recursos escassos em tempos de crise e que os benefícios sejam igualmente distribuídos, sobretudo para eleger a Educação como prioridade nacional em todas as esferas governamentais.
Carta Resposta FIFA
Fonte: CAU/DF